quarta-feira, 18 de janeiro de 2006

Quando a Música suplanta os sentimentos (ou "Era uma vez no palco")...

Entrei há dias em palco, com o intuito de praticar a minha insubstituível actividade, através da actuação num concerto com uma Banda Filarmónica à qual me encontro agregado há cerca de 8 anos...

A véspera tinha sido muito complicada... O ensaio tinha corrido de muito pouca feição, mas logo na altura o Jovem Mestre nos consolou, relembrando que "mau ensaio prenuncia bom Concerto".

E assim aconteceu... Um espectáculo brilhante, como há muito não se via naquela terra... Um repertório assinalável, que custou a ensaiar, mas rendeu os seus frutos.

Acabado, o dito concerto, era hora de voltar a cair na dura realidade da vida...

Alguns problemas, ocorridos em dias anteriores, andavam-me a apoquentar o Juízo, e não me largavam... Triste de mim!!! Voltava pra casa, pensando novamente como suplantar aquela difícil fase da minha vida, qual crise existencial que me moía o cérebro, e me fazia lamentar a sua origem...

Eis que senão me apercebi que algo tinha ocorrido durante aquela hora de trabalho...

Enquanto decorria o concerto, durante aquela hora, todas as minhas lembranças como que se apagaram da memória... A concentração era tanta (tamanha era a responsabilidade que me era imputada naqueles instantes) que apenas dava para contemplar as pautas que à minha frente se encontravam, e a Regência... Nesse momento, apenas tinha de cumprir a missão da qual tinha sido incumbido... Mas ao contemplar aquelas folhas de papel, revestidas de pautas, claves, notas e figuras, notei que a execução do trecho desenvolvia-se por mero instinto... Os meus olhos viam, os meus dedos mexiam, e os meus lábios tocavam... Sem que nada nem ninguém lhes ditasse o que fazer.

Não era a minha cabeça que pensava... Era aquela suave melodia que, transportada pelo ar, invadindo os nossos ouvidos, nos levava a imaginar um qualquer cenário. Tudo o que a nossa imaginação pudesse alcançar... E enquanto nos enquadrávamos nesse cenário, todo o Mundo que nos rodeava desaparecia, num piscar de olhos, por entre duas colcheias, antes, durante e depois de um qualquer compasso... E todos os problemas desapareciam com ele...

É essa magia que a Música provoca em nós que me fascina, que me faz lembrar que, por entre aquelas nuvens negras que constantemente têm pairado sobre a minha cabeça, ainda consigo enxergar um raio de luz, que me ilumina e me transporta para um Paraíso, longe de tudo e de todos, onde tudo nos encanta, e onde os sons nos mostram o caminho da nossa redenção...

No fundo, trata-se de música. Actuar. Usar o palco para ensinar e aprender. Trata-se de todas as coisas que não se podem aprender num manual. Trata-se de compreender o Mundo através da experiência e/ou dos sentimentos, e de nos embrenharmos num outro Mundo, paralelo, onde tudo nos fascina, e nos leva ao Paraíso das nossas sensações...

1 comentário:

João Ferreira disse...

A musica é, sem duvida, o melhor metodo de descontracção que conheço...
Só é pena que a sensação não perdure...